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Noticia de: 07 de Dezembro de 2017 - 15:39 | ||
Por que os juros bancários para o consumidor caem menos que a Selic? | ||
A taxa básica de juros foi cortada pela décima vez seguida neste
início de dezembro. De 14,25% em outubro de 2016, a Selic atingiu 7%, o menor
nível dos últimos 20 anos. Nesse mesmo intervalo, os juros do cheque especial,
uma das modalidades mais caras do mercado, também recuaram, mas
proporcionalmente bem menos: de 328,5% para o patamar ainda proibitivo de
323,7% ao ano.
O descompasso ilustra a dinâmica que
marcou o ciclo de mais de um ano de afrouxamento do juro básico. O custo dos
empréstimos para empresas e consumidores começou a recuar de forma mais
perceptível apenas na segunda metade de 2017 - e em ritmo bem mais lento que o
da taxa definida pelo Banco Central.
As razões para isso vão desde a
defasagem entre as decisões de política monetária e seu reflexo no crédito até
a rigidez do spread - a diferença entre a taxa que os bancos pagam para captar
recursos e a que cobram nos empréstimos -, que cedeu pouco no decorrer deste
ano.
Depois da última decisão do Comitê de
Política Monetária (Copom) do BC de 2017, divulgada nesta quinta-feira, a
expectativa é que a Selic se mantenha no nível atual em 2018, dizem
especialistas consultados pela BBC Brasil, cenário que abre espaço para que as
taxas para pessoa física e jurídica recuem um pouco mais até 2019.
Já a diminuição significativa dos
juros estruturalmente altos que colocaram o Brasil no topo dos rankings
internacionais - dos quais são sintoma, por exemplo, as taxas acima de 100%
cobradas no crédito pessoal - vão além da política monetária.
Mais lento que o esperado
A trajetória de
queda dos juros para consumidores e empresas tem sido mais vagarosa do que
antecipava no início do ano o economista Vitor Velho, que acompanha o segmento
de crédito na LCA Consultores.
O corte da Selic reduziu o custo de
captação das instituições financeiras - os bancos pagam mais barato para obter
recursos e repassam parte dessa economia reduzindo as taxas -, mas não teve
impacto significativo sobre o spread, ele justifica.
A taxa média total cobrada à pessoa
física, por exemplo, recuou de 42,2% ao ano em janeiro para 34,2% em outubro
(último dado disponível). A queda é significativa, mas ainda está 6,9 pontos
percentuais acima da mínima histórica da série do Banco Central, de 27,3%,
registrada em maio de 2013 - quando a Selic saía de um outro ciclo de
afrouxamento, que a levou a 7,25% até março daquele ano.
Em paralelo, o spread na taxa média para pessoa física,
por sua vez, diminuiu de 33,1 pontos para 27,6 pontos entre janeiro e outubro -
tendo atingido 20 pontos em 2013. "O que chega ao consumidor vai sempre
passar pelo spread bancário", ele destaca.
Risco de calote
A resistência da
diferença entre os juros que o banco paga ao captar e a taxa que ele cobra ao
oferecer empréstimos é reflexo, em parte, do nível relativamente elevado da
inadimplência, diz o professor da Universidade de São Paulo (USP) Gabriel
Madeira.
A lógica é que, quanto maior o risco
de calote, maior o "prêmio" que os bancos vão embutir em suas taxas
de juros.
Esse é um indicador que vem
melhorando de forma lenta, pondera o economista, por uma característica da
própria recessão, marcada pelo endividamento de famílias e empresas.
Os bancos também tendem a retrair a
oferta de crédito, ele acrescenta, diante do cenário atual de desemprego alto,
de recuperação fraca da economia e das dúvidas em relação às eleições de 2018.
Tudo isso gera incerteza sobre a capacidade de pagamento dos brasileiros.
"As taxas funcionam como um
ativo. Quanto maior a oferta, maior a concorrência - e os preços tendem a cair
mais", ilustra Michael Viriato, professor do Insper.
Nesse sentido, afirma Velho, da LCA,
a concentração que marca o setor bancário no Brasil - onde quatro instituições
respondem por praticamente 75% do crédito - também é um obstáculo à queda mais
expressiva dos juros.
Em quanto as taxas caíram?
Em outubro, o
crédito pessoal estava 4,2 pontos percentuais mais barato do que no mesmo mês
do ano passado, em 132% ao ano. Nesse período, o consignado recuou 3 pontos,
para 26,6%, enquanto os juros médios para a aquisição de veículos diminuíram
3,3 pontos, para 22,5%. Modalidade do chamado crédito
direcionado, que é subsidiado, a taxa média do financiamento imobiliário
diminuiu 2,1 pontos, para 8,6% ao ano.
A maior redução foi a do rotativo do cartão de crédito, a
linha mais cara do mercado, que passou de 484% ao ano para 337,9%, queda
patrocinada por uma mudança de regulamentação instituída em abril deste ano
pelo Banco Central, que restringiu o pagamento mínimo das faturas e a
consequente rolagem da dívida para o mês seguinte.
Já para as empresas, as modalidades
que mais recuaram, conforme os dados da nota de Operações de Crédito do Sistema
Financeiro publicada pelo BC, foram a antecipação de faturas de cartão de
crédito e os descontos de duplicatas e recebíveis, que cederam 19,2 pontos e
14,5 pontos percentuais, nessa ordem, para 27% e 20,9% ao ano.
Dificuldade maior para empresas
Esses são
produtos, aliás, que mais têm sido procurados pelas empresas neste ano, em que
as concessões cresceram mais entre janeiro e outubro, destaca o economista do
banco Votorantim Carlos Lopes.
"O perfil ainda é muito ligado à
crise", ele pontua, ressaltando que as concessões de modalidades ligadas a
investimento ainda estão mais de 50% abaixo da média observada entre 2011 e
2015. Em sua avaliação, a melhora do
cenário de crédito em 2017 é mais concentrada nos consumidores do que nas
empresas, segmento em que a recuperação é ainda mais lenta e que ainda tem
dificuldade de acesso aos empréstimos.
"O juro caiu um pouco, mas a
burocracia aumentou", concorda o empresário Daniel Domingues Pires, dono
de uma distribuidora de pescados em São Paulo.
Por trabalhar com um negócio bastante
sazonal - ele vende camarões para cerca de 200 restaurantes na capital paulista
e no ABC -, Pires precisa com frequência recorrer a instituições financeiras
para "acertar o fluxo de caixa".
Diante da dificuldade, ele tem
buscado alternativas ao sistema bancário tradicional. Há um mês o empresário
usa o serviço de uma startup digital do setor financeiro que antecipa recebíveis
(ou seja, faz empréstimos condicionados a um pagamento futuro de um cliente) em
poucas horas, um serviço que lhe tomava mais de um dia de negociação com o
gerente do banco. Fonte - G1 |
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